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Sistemas agroflorestais: símbolos de uma economia resiliente, inovadora e regenerativa

A compreensão do meio ambiente como um aliado do desenvolvimento econômico oportuniza ao Brasil se posicionar como protagonista global de uma nova “economia regenerativa”

Por Rodrigo Condé

A Mata Atlântica é a casa de cerca de 70% da população brasileira e, apesar de ter sido devastada e reduzida a cerca de 7% de sua cobertura original, ainda guarda grande parte da biodiversidade brasileira. Além da imensa riqueza biológica que abriga, a Mata Atlântica também é uma importante provedora de serviços ecossistêmicos, que são aqueles benefícios que só uma floresta conservada pode gerar: produção de água, ar puro, controle do clima, entre tantos outros “favores” que a natureza proporciona e são tão importantes para a perpetuação de uma economia e sociedade prósperas e resilientes.

A conservação do bioma implica não só em proteger as áreas mais sensíveis e extensas que ainda existem, mas também em gerar alternativas de renda compatíveis com a conservação da biodiversidade e que permitam a continuidade da geração dos serviços ecossistêmicos na paisagem.

Os sistemas agroflorestais (SAF) são sistemas produtivos que permitem o casamento perfeito entre a conservação da natureza e produção de alimentos, madeira, sementes ou frutos. Na agrofloresta, há a união da tecnologia da floresta tropical com as técnicas de agricultura para criar ambientes produtivos que sejam amigos da natureza. Parece inovador, não é mesmo? Mas nem tanto. 

Agroflorestas: herança dos povos originários

A agrofloresta representa mais o resgate dos conhecimentos ancestrais e o entendimento dos processos ecológicos do que a “invenção da roda” como muitos vendem por aí. Essa solução sempre esteve presente nas comunidades tradicionais e entre os povos originários sul americanos, que possuem um riquíssimo conhecimento sobre como cultivar alimentos em harmonia com a floresta.

A criação de uma agrofloresta começa pelo respeito ao conhecimento tradicional da comunidade onde esse sistema será implantado. A comunidade sempre saberá qual é a melhor variedade de mandioca, onde estão disponíveis os frutos nativos da estação e qual é a época certa de plantar o milho, por exemplo. 

Associado a esse conhecimento tradicional, os técnicos escolhem os melhores espaçamentos entre as plantas, planejam quais e quando elas serão plantadas e projetam o funcionamento desse sistema ao longo dos anos. Diferente da agricultura tradicional, que é baseada na monocultura e na seletividade, na agrofloresta o grande trunfo é a diversidade

Nos SAF são aproveitados todos os raios solares e essa floresta produtiva é pensada como um grande condomínio de edifícios, onde em cada andar se produz uma cultura que tem exigência diferente de luz e nutrientes. Isso permite a otimização da área e a produção de múltiplos alimentos e produtos no mesmo espaço, oferecendo oportunidades de geração de renda e uma alimentação mais equilibrada para a família produtora rural. 

Além de sua função produtiva, os SAFs também são abrigo para a fauna, servem como uma fábrica de serviços ecossistêmicos e ainda acumulam carbono, podendo ser importantes aliados do combate à mudança do clima. 

Cooperação internacional para fomentar SAFs

A SPVS, uma organização do terceiro setor que atua há quase 40 anos no litoral do Paraná, está apostando na agrofloresta como uma alternativa complementar e agregadora aos sistemas produtivos vigentes na região.

O pontapé inicial neste projeto foi o plantio de cerca de 50 mil m² de agrofloresta (equivalentes a 5 campos de futebol) em áreas próprias e de agricultores parceiros na região conhecida como Grande Reserva Mata Atlântica, que consiste no maior contínuo de Mata Atlântica ainda conservado que permeia os estados de São Paulo, Paraná e Santa Catarina.

Atuando em parcerias com a ReNature, organização internacional que utiliza o vasto potencial da Agricultura Regenerativa na luta contra os desafios mais prementes de hoje – como mudanças climáticas, pobreza, perda de biodiversidade e insegurança alimentar – e também no âmbito do Projeto Biodiversidade e Mudanças Climáticas na Mata Atlântica, o projeto é realizado pelo Governo Brasileiro, coordenado pelo Ministério de Meio Ambiente (MMA), no contexto da Cooperação Brasil-Alemanha para o Desenvolvimento Sustentável, no âmbito da iniciativa Internacional de Proteção do Clima (IKI) do Ministério do Meio Ambiente, Proteção da Natureza e Segurança Nuclear da Alemanha (BMU) e tem apoio financeiro do KfW Entwickçungsbank (Banco Alemão de Desenvolvimento), por intermédio do Fundo Brasileiro para a Biodiversidade – FunBio.

Os SAFs desenvolvidos pela SPVS são baseados no uso de espécies nativas da Mata Atlântica e produção de culturas alimentares tradicionais como mandioca, banana, inhame, feijão, entre outros. As frutas nativas da Mata Atlântica são a grande aposta desse sistema, pois, além de deliciosas e nutritivas, possuem um grande potencial no mercado de cosméticos, farmacêutico, gastronômico e de geração de novos produtos.

Entre as frutas cultivadas, merecem destaque a cereja do rio grande, a grumixama, o araçá e a juçara. Esta última  produz uma polpa semelhante ao açaí, que é nativo da Amazônia e viaja milhares de quilômetros até o mercado consumidor do sul/sudeste. Embora essas e outras frutas disponíveis na Mata Atlântica ainda sejam desconhecidas pelo grande público, elas sempre estiveram presentes nos quintais Brasil afora.

O meio ambiente é um aliado do desenvolvimento econômico

A sobrevivência da Mata Atlântica e a consequente continuidade da geração dos serviços ambientais de forma perene para milhões de brasileiros requer esforços múltiplos, que envolvem o poder público, a sociedade e as empresas. O ambiente rural e periurbano tem papel fundamental nesse contexto, e o produtor rural é um importante ator na geração dos serviços ambientais que são desfrutados pelos habitantes das grandes cidades.  

A compreensão do meio ambiente como um aliado do desenvolvimento econômico oportuniza ao Brasil se posicionar como protagonista global de uma nova “economia regenerativa”, que é capaz de gerar emprego e renda de forma mais igualitária, sem esgotar os recursos disponíveis e ainda deixar um saldo positivo para as futuras gerações. 

A escolha não é muito difícil: começamos a agir agora rumo a uma economia mais resiliente, inovadora e regenerativa ou estaremos fadados a um futuro incerto com sérios prejuízos na geração de serviços ecossistêmicos e submetidos de maneira irreversível as mazelas da mudança do clima.

Rodrigo Condé é Mestre em Engenharia Florestal pela UFPR, Engenheiro Florestal na re.nativa – soluções baseadas na natureza – é especialista no uso de espécies nativas e atua com treinamento, projetos, implantação e monitoramento de sistemas agroflorestais e restauração florestal produtiva na região da Grande Reserva Mata Atlântica (PR, SC e SP) e consultor da SPVS.

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