Entrevistas

Por dentro das empresas B: uma entrevista com Pedro Telles, do Sistema B Brasil

Entenda como funciona o trabalho do Sistema B Brasil, conheça melhor o processo de certificação das B Corps e convença-se a se unir a esse movimento

Ampliar a voz das empresas B e do movimento global de que elas fazem parte é um de nossos principais objetivos. Só no Brasil existem mais de 160 empresas certificadas. Cada uma delas escreve uma história única, que contribui para transformar o capitalismo. 

Entre as B Corps brasileiras estão gigantes como a Natura, que é uma das empresas certificadas mais respeitadas do mundo, até microempreendedores individuais. Este é um movimento democrático, que reúne pessoas e organizações interessadas em serem melhores para o mundo

Por trás de tudo isso está o Sistema B Brasil, entidade responsável por coordenar o processo de certificação no país e por disseminar o movimento que propõe uma nova genética econômica pensada para que valores e ética inspirem ações coletivas, sem se esquecer de interesses particulares.

Para entender melhor o trabalho do Sistema B Brasil, conversamos com Pedro Telles, Gestor de Comunidades e Expansão da entidade.

Pedro é economista pela PUC-Rio e mestre em administração pelo COPPEAD/UFRJ. Desde 2017, ele trabalha como consultor, apoiando empresas na transição para uma atuação que considere a sustentabilidade e o impacto social dentro do seu processo. Professor do curso de Negócios de Impacto da PUC-Rio, Pedro também possui certificado do Global Reporting Initiative (GRI) para elaboração de relatórios de sustentabilidade e é Fellow do Social Good Brasil.

Acompanhe a conversa e inspire-se para, assim como nós, juntar-se ao movimento das empresas que são forças para o bem.

A Economia B: Para começar, explica pra gente o que é o Sistema B.

Pedro Telles: O papel do Sistema B é representar o movimento das B Corps no Brasil e na América Latina. 

Na prática, nós incentivamos as empresas certificadas a trocarem ideias e a fazerem negócios entre elas. Além disso, fazemos a aproximação com empresas que estão tentando se tornar B, dando apoio para que utilizem as nossas ferramentas e se baseiem nos propósitos desse movimento global. 

Hoje, o Brasil é um dos maiores mercados do mundo quando falamos em empresas que utilizam a B Impact Assessment (BIA), plataforma que avalia o quanto uma empresa está preparada para se certificar. Atualmente, são 165 empresas B certificadas no país, e o número cresce a cada mês. Além disso, são mais de 6 mil empresas brasileiras utilizando a plataforma para medir seu impacto, e com isso, buscar a certificação.

Isso é maravilhoso, e a gente espera que cada vez mais empresas consigam a certificação. Mas reforço que o ponto principal do movimento é transformar a visão dessa economia antiga que só pensa em maximizar os lucros dos acionistas. Nosso foco é a chamada stakeholder economy, que tem a ver com incluir todas as partes envolvidas no negócio.

Para impulsionar essa mudança, queremos que a maior parte das empresas brasileiras utilize a BIA para medir seu impacto social e ambiental. Ela é gratuita, online e entrega o feedback na hora.

Tem alguma história que envolva a comunidade do Sistema B que você possa compartilhar com nossos leitores?

Pedro: Como eu fui responsável pela comunidade Sistema B no Rio de Janeiro por muito tempo, tive uma proximidade muito grande com as B Corps cariocas. São aproximadamente 30 empresas certificadas só no estado do Rio de Janeiro. Uma história legal sobre essa comunidade é que temos uma reunião mensal com todas elas. As pessoas se reúnem para dividir dores, conversar, pensar em possibilidades de construção em conjunto e compartilhar oportunidades.

O encontro acontece todo mês, religiosamente. Não muda. É sempre no mesmo horário, no mesmo dia. E a gente consegue manter essa relação mais próxima com as empresas nesses encontros.

Além disso, uma vez por ano acontece o que chamamos de encontro de líderes, em que reunimos  todas as empresas B do Brasil. Em 2019, o evento foi São Paulo e contou com a participação de mais de cem empresas.

Por fim, assim como há o B Corp Summit, que vocês foram cobrir em Amsterdam, temos o Encontro + B, que é organizado pelo Sistema B Internacional, que cuida da América Latina. É um encontro que reúne todos os Sistemas B nacionais dos países latinos. 

Em paralelo aos eventos, a gente tem diversas ferramentas para promover engajamento – desde grupos de e-mail (em que cada empresa tem acesso a todas as empresas B e pode mandar oportunidades e trocar ideias) até a plataforma B Hive, que é um fórum fechado para as empresas B do mundo todo se conectarem e compartilharem boas práticas. 

O que você indicaria como ponto de partida para uma empresa interessada em se certificar como empresa B?

Pedro: A palavra-chave para esse primeiro passo é transparência.

A gente tem consciência de que nenhuma empresa é perfeita. Nem os nossos melhores cases são perfeitos. Afinal, empresas são feitas de pessoas, e pessoas não são perfeitas, nem vão ser. Sempre irão existir pontos a serem melhorados. O importante é saber que esses pontos existem e não tentar se passar como uma empresa perfeita, mas trabalhar para resolver os problemas. 

Existe uma série de ferramentas que possibilitam essa gestão do seu impacto social e ambiental. Impossível não ser “clubista” nesse ponto, porque a B Impact Assessment (BIA), nossa ferramenta de avaliação de empresas – que é o questionário de avaliação do Sistema B, que citei anteriormente –, oferece uma grande base de como trabalhar, que tipo de diretrizes você tem que tomar e quais são mais valorizadas. 

Ela é dividida por todas as áreas da empresa. Há questionamentos sobre: 

  • A área de governança;
  • Os trabalhadores;
  • A área de comunidade (ou seja, como você lida com os fornecedores, com a diversidade dentro e em torno da sua empresa);
  • O meio ambiente;
  • O impacto que você gera nos seus clientes, ou através deles.

Repito: é 100% online e 100% gratuita. A gente entrega essa análise do impacto atual da empresa através de uma pontuação e de perguntas diretas e práticas, que servem como base para desenvolver uma estratégia.

Conheça a BIA!

 

Quais são as principais que dificuldades as empresas enfrentam no processo de certificação?

Pedro: A BIA faz muitas perguntas sobre processos, sobre transparência, sobre como você comprova o impacto que está falando que gera. Quando falamos em empresas menores, é comum que esse seja o primeiro desafio. Ou seja, a empresa faz bastante coisa, mas tem pouca documentação sobre o que faz. E a pontuação depende da comprovação. Então, é um desafio padrão, principalmente para as empresas que têm dificuldade para formalizar todo esse processo de comprovar. 

Na outra ponta, entre as empresas maiores, como a barra para obter a pontuação necessária é muito alta , o que acontece é que cada mudança que o questionário indica como possibilidade de melhoria é uma mudança complexa. Não é simples você melhorar uma empresa gigantesca do dia para a noite. 

Acho que dá para criar um primeiro padrão que é isso: o processo para as empresas maiores é bem demorado, complexo e exige uma dedicação grande nesse caminho de mudança. Enquanto as menores têm uma facilidade maior de aplicar as mudanças, mas nem sempre têm tudo isso documentado.

O José Eduardo Guzzardi, gestor de estratégia e engajamento multinacional no B Lab (Nova York), falou que um dos pontos que motivam as empresas a buscar a certificação é atrair talentos. Existem outros que você pode elencar?

Pedro: Tem uma série de estudos que comprovam benefícios que vão além desse. Desde a facilidade de ser fornecedor de alguém que tem clareza e transparência nos seus processos internos até sobre resiliência em momentos de crise. 

Empresas que incluem dentro do seu modelo de negócio o impacto social e ambiental acabam ficando mais protegidas durante crises. Temos uma série de cases de empresas com comprovações vivas de que dá para fazer negócios enquanto cuida de problemas sociais e de problemas ambientais. Sem que isso seja uma escolha entre um e outro. 

 

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Como você analisa esse momento delicado que a gente vive no Brasil e no mundo com a pandemia da Covid-19?

Pedro: É uma conversa que a gente vem tendo há muito tempo. Em algum momento o modelo econômico que vem sendo construído ia dar problema, uma hora esse tipo de coisa iria acontecer. É lógico que ninguém imaginava que o problema seria uma pandemia dessa magnitude. Mas são indícios que deixam claro que é preciso repensar.  

Como a gente passa desse primeiro susto inicial – que é o desespero de como as empresas podem continuar vivas –, como elas conseguirão se manter? Começamos a pensar em quais cenários teremos quando a crise passar. Então, não se trata de quando a gente pode voltar para o normal, mas como a gente pode construir um modelo novo.

Para encerrarmos, gostaria que falasse sobre o CoVida20, programa de financiamento voltado a negócios de impacto desenvolvido pelo Sistema B.

Pedro: O CoVida20 é um programa de apoio a pequenas e médias empresas que estão passando por dificuldade nesse momento. 

A ideia é facilitar o acesso à capital a negócios de impacto, com condições muito mais adequadas ao momento e à realidade das empresas. O  propósito é ajudá-las a passar por esse momento.

E não é voltado apenas para as empresas B. O CoVida20 é direcionado a todos os negócios de impacto. Junto com o Sistema B, temos o movimento Capitalismo Consciente e duas empresas B nessa empreitada – a Tre e a Din4mo, gestoras de investimentos com foco em causas sociais e ambientais. 

Entre as exigências para as empresas obterem os recursos está a preservação de empregos.

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Pedro, você gostaria de acrescentar algo?

Pedro: Fica o convite para os leitores se conectarem ao Sistema B Brasil. Estamos no Instagram e no LinkedIn. Estamos aqui para ouvir e ajudar qualquer empresa que queira caminhar para esse novo modelo de economia que estamos propondo. 

Para saber mais

Crédito das fotos: Divulgação Sistema B Brasil e Markus Spiske em Unsplash

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Publicado por
João Guilherme Brotto

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