Capitalismo Consciente é um movimento internacional que reúne pessoas e empresas que trabalham para redesenhar o capitalismo. Apesar de o nome parecer controverso, o movimento cumpre o papel de levar o debate sobre uma nova forma de fazer negócios até mesmo aos mais céticos
A história do movimento Capitalismo Consciente começou a ser escrita nos EUA, em 2007, a partir de um estudo acadêmico conduzido por Raj Sisodia, Jaf Shereth e David Wolf…
Na época, os pesquisadores estavam interessados em entender como algumas empresas conseguiam manter alta reputação e fidelidade dos clientes sem ter investimentos exorbitantes em publicidade e marketing. Para isso, acompanharam o desempenho das ações das companhias listadas no S&P 500 durante 15 anos.
Ao fim do estudo, eles concluíram que organizações com propósito claro têm melhor desempenho financeiro, uma imagem mais positiva e gastam muito menos em marketing do que a maioria das 500 maiores empresas dos EUA. Inclusive, essas empresas superaram o S&P 500 em 14 vezes, e as consagradas Good to Great, de Jim Collins, em seis vezes!
A pesquisa resultou no livro Firms of Endearment – lançado no Brasil como Empresas Humanizadas (Alta Books). Em 2010, com a criação da ONG Conscious Capitalism Inc., o movimento foi oficializado. Hoje, além de atuar nos EUA, está presente no Brasil, no México, na Espanha e em Israel.
Este gráfico mostra um comparativo de performance entre as Firms of Endearment (FoE), as Good to Great e o S&P 500
Para entender melhor as ideias do movimento, conversamos com Dario Neto, atual diretor-executivo do braço brasileiro do movimento.
No início da conversa ele nos explicou a base do conceito. “O professor Sisodia defende que a tese do Capitalismo Consciente é muito simples: o melhor jeito de se dar bem é fazendo o bem. Claro que, para isso, às vezes você vai ter que comprometer o resultado de um trimestre ou semestre, mas em um recorte de 15 anos, por exemplo, verá que empresas que compartilham os quatro pilares vão prosperar financeiramente mais que os concorrentes e vão proporcionar mais avanços coletivos, sociais, ambientais e econômicos”, explica.
Perguntei a Dario se eles recebem críticas e questionamentos por combinar palavras com significados historicamente antagônicos para dar nome a um movimento empresarial. “Recebíamos mais críticas há alguns anos, mas hoje são menos questionamentos. Já cheguei a ser interrompido em workshops por pessoas defendendo o modelo socialista e cooperativas como o caminho. O que dizemos é que a culpa não é do sistema. A gente entende que o aumento das desigualdades e da concentração da riqueza não é culpa do modelo, mas da forma como fazemos negócios e consumimos”, afirma.
É um debate complexo que pode ser argumentado por diversos pontos de vista, mas é fato que o crescimento de um movimento como o Capitalismo Consciente pode ser visto como mais um sinal da transformação do modelo econômico dominante e, também, como a consolidação de uma tendência. São 163 associados PJ e mais de 2 mil pessoas físicas.
Além disso, mesmo que os motivos para o despertar ESG que muitas empresas têm anunciado não sejam baseados em um desejo genuíno de fazer o que precisa ser feito, a constatação de que para aumentar vendas, margens e ROI não será possível ignorar a desigualdade social e um potencial apocalipse climático, pode impulsionar mudanças necessárias.
“O que acontece agora é que não tem outra forma de fazer negócios. O ESG chegou nas organizações, se misturou com a demanda da sociedade, dos clientes, da força de trabalho e dos jovens. E o fato de ter sido reforçado pelos donos do dinheiro, que perceberam que mudança climática e desigualdade mexem no ponteiro do retorno, evidencia que não tem outro caminho. Vira prioridade zero porque captação de recursos é prioridade de qualquer empreendedor. Fazer essa mudança cultural será uma questão de sobrevivência. Em algum grau, já é em alguns mercados”, analisa.
Dario reforça que, ainda que seja um movimento capitalista, o Capitalismo Consciente não tem o objetivo de defender o sistema, mas a transformação das lideranças e das pessoas, independente do modelo econômico vigente. Neste sentido, o Instituto cumpre o papel de ser a porta de entrada para pessoas interessadas em ressignificar modelos de negócios e em se tornarem agentes de mudanças.
Ele defende a tese de que o que faz os modelos não funcionarem “é o ego das lideranças, a sede pelo poder, os paradigmas e crenças de que o que é bom pra mim é bom pra todo mundo”.
“Com isso, a visão mais interdependente e ecocentrada acaba ficando em segundo plano. Claro que existe uma influência da dinâmica econômica na forma como consumimos e gerimos empresas, mas, no fim do dia, você pode escolher fazer negócios de um jeito que deixe as pessoas pra trás ou de um jeito que não deixe. É possível diminuir um pouco o resultado financeiro dos acionistas no curto prazo para não deixar ninguém para trás. Tem a ver com trazer amor e cuidado nas relações para dentro da sua visão de mundo. Isso transcende a visão econômica. É a sua cosmovisão, como você enxerga relações, pessoas e crenças”, complementa.
Episódios como o caso recente das críticas recebidas pela Magalu quando abriu um programa de trainee exclusivo para pessoas negras mostram o quanto a sociedade precisa amadurecer, quem dirá o mercado. Em tempo: nunca é demais lembrar que racismo reverso não existe.
Dario nos revelou que os líderes presentes – muitos deles à frente de empresas com milhares de funcionários – estavam claramente desconstruindo crenças enquanto ela falava. Credita isso ao fato de a reunião ser um ambiente de segurança psicológica para o grupo. “Se tem resistência? Tem um monte. O desafio está na abordagem, na linguagem e na construção desses ambientes de segurança psicológica e vulnerabilidade para qualquer liderança se sentir confortável para perguntar, trocar e evoluir junto”, revela.
As pautas de ações sociais e ambientais no meio empresarial ainda são cercadas de desconfiança. Há os que temem repercussões negativas por se engajarem em pautas ‘políticas’, os que não se identificam com essas demandas, os que simplesmente não se importam e os que até entendem, mas não sabem como agir.
E é justamente esses perfis que o Capitalismo Consciente tem mais interesse em atrair. “Celebramos muito mais a chegada de um novo associado que não seja uma empresa alinhada à pauta do que um que já seja. Não estamos muito preocupados em dar suporte a empresas B ou a companhias que já estão na vanguarda ESG. Estamos focados nas centenas de milhares de CNPJs e milhões de líderes que estão vendo o buzz da transição do capitalismo e a explosão do ESG, percebendo que essas discussões estão chegando em seus boards, conselhos, acionistas e lideranças, mas não sabem muito o que fazer”, revela.
Além disso, ele acrescenta: “alinhamos com o Sistema B que a gente é quase como um topo de funil para eles. Atraímos e damos suporte à jornada até que ele veja que não basta e queira se posicionar e buscar a certificação B, por exemplo. O que de fato vai viabilizar a transformação é o que chamamos de ODS 0 – Evolução da conscientização das pessoas”.
Para alcançar seu objetivo, o Instituto Capitalismo Consciente procura se comunicar com o mercado utilizando uma abordagem mais acolhedora e menos ativista e julgadora.
“Não somos um clube de empresas conscientes, nos posicionamos como uma organização que acolhe toda e qualquer empresa que acredita em nossos pilares e está disposta a ser melhor. É claro que não podemos apoiar greenwashing, mas temos que ser uma entidade que vem e fala: ‘Vamos juntos. Quer começar por onde? Diversidade e inclusão? Gestão de stakeholders? Meio ambiente? Impacto de carbono?’ A beleza do movimento é ser pouco julgador, mais inclusivo e servir de topo de funil para esse movimento que não é nosso”, pondera.
A importância de uma linguagem não ativista para conversar melhor com o público ‘topo de funil’ para esse movimento de ressignificação do capitalismo é explicada em uma história baseada, de novo, na semântica.
“A abordagem muda tudo. Em algum momento lançamos a campanha antirracista. Algumas empresas assimilaram rápido, outras acharam interessante, mas tiveram que passar por várias alçadas de governança antes de se comprometer, porque tinham medo da reação de clientes e fornecedores. Por outro lado, tínhamos empresas que não sabiam como agir e que não iam aderir ao tema porque isso tem muito a ver com ativismo, em ser um signatário público. Depois de um tempo começamos a tratar do tema com uma linha de promoção de igualdade racial. Essa segunda abordagem trouxe mais gente para a conversa, gente que tem dúvidas”, explica.
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Na prática, para começar uma transformação de forma mais branda, Dario indica olhar para a adoção dos fatores ESG. “Que tipo de boas práticas posso trazer para o negócio a ponto de potencializar o grau de qualidade das minhas relações com a comunidade, meio ambiente e todas as partes?”, questiona.
Partindo do princípio de empresas ‘topo de funil’, ou seja, que estão começando a olhar para o ESG, os quatro pilares do Instituto Capitalismo Consciente são um ponto de partida. Relembrando:
Porém, se a empresa estiver interessada em fazer uma transformação radical, Dario recomenda um olhar crítico sobre o modelo de negócio.
“Se ela quiser de fato ser uma empresa que cura, que resolve problemas e não gera mais problemas, terá que rever o modelo para entender o quanto é regenerativo ou não. Dependendo do porte da empresa, dá pra olhar pra governança, critérios de transparência, stakeholders. Ou começar pelo RH, com boas práticas de inclusão e diversidade na força do trabalho. Tem ‘n’ caminhos, dependendo de com quem estamos falando: Conselho, CEO, RH ou Executivos, mas o fato é que dá pra começar”, orienta.
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Se você se interessou pelas ideias do Capitalismo Consciente, Dario sugere estudar as obras publicadas pelo Instituto. Há uma loja com vários livros, mas ele recomenda estes dois como ponto de partida:
Livro Empreendedorismo consciente: Traz a pesquisa que deu origem ao movimento no BR. É uma pesquisa conduzida pela startup Humanizadas, que está na terceira edição. Ela é resultado de um projeto de pesquisa de doutorado da USP. O livro conta histórias de empresas brasileiras alinhadas com os pilares do Capitalismo Consciente.
Livro Empresas humanizadas: Obra que deu origem ao movimento. Fala das bases filosóficas, framework e pilares.
Além disso, nosso entrevistado destacou os conteúdos do Capitalismo Consciente Brasil. “O canal do CC Brasil no YouTube tem uma série especial que conta casos práticos de empresas ligadas ao movimento. O podcast #MaisConsciente tem um episódio para cada ODS. Junto com convidados, apresento os Desafios e debatemos ideias e soluções”, conclui.
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