Entrevistas

Os humanos de negócios e o futuro do capitalismo e da sociedade

Humanos de Negócios – Rodrigo Cunha

Humanas e humanos de negócios estão transformando o capitalismo e a sociedade. Entenda por que e conheça um projeto que compartilha as histórias dessas pessoas

Você já deve ter ouvido alguém falar algo como: “não vou assistir ao jornal, só tem notícia ruim”. Talvez, você mesmo pense assim. E, de certa forma, isso é até compreensível, já que de fato somos diariamente “bombardeados” por informações tristes, difíceis de aceitar e, algumas vezes, até aparentemente desnecessárias. 

Por outro lado, saber o que está acontecendo no mundo é fundamental para podermos pensar em formas de contribuir para que dias melhores sejam possíveis… 

Ou seja, às vezes a sensação que dá é que estamos em uma estrada que termina em diversos caminhos, e não sabemos por qual seguir.

A boa notícia é que existem cada vez mais canais que buscam apresentar um viés positivo e esperançoso da vida. Isso porque eles focam nas coisas boas que continuam acontecendo e, além disso, nas pessoas que buscam fazer o bem.

O ator e humorista norte-americano John Krasinski (conhecido principalmente por seu trabalho na série de TV The Office), por exemplo, criou no começo do ano um canal no YouTube com a intenção de compartilhar apenas fatos positivos. Quatro meses depois do lançamento, Some Good News (Algumas Notícias Boas) já bateu a marca de mais de 2.5 milhões de inscritos. 

Em um dos episódios mais populares, John reuniu seus ex-colegas de “escritório” para celebrar um casamento de um casal de fãs…

O vídeo ainda não tem legenda em português.

É possível pensar além do lucro?

O sucesso de Some Good News, que aborda os mais variados assuntos, mostra que as pessoas estão interessadas em conteúdos com essa entonação mais positiva em todas as esferas da vida.

Inclusive, o mundo corporativo não fica de fora desse movimento! Afinal, apesar de a visão do “lucro acima de tudo” ainda prevalecer em muitas empresas, é cada vez mais comum encontrar pessoas e instituições preocupadas com questões que vão bem além do retorno financeiro. Caso, por exemplo, das B Corps – que foram as grandes fontes de inspiração para a criação de A Economia B, aliás. 

Acontece, porém, que muitas vezes as histórias dessas pessoas e empresas não chegam ao grande público. Mas, aos poucos, isso parece estar mudando… 

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A vontade de fazer mais e as primeiras reflexões que embasaram o projeto humanos de negócios

Rodrigo Cunha – fundador do projeto Humanos de NegóciosNatural de Porto Alegre (RS), Rodrigo Cunha é jornalista e ao longo de sua carreira trabalhou em alguns dos principais veículos do país – como a revista Veja e o jornal Zero Hora. 

Ainda enquanto repórter, no início dos anos 2000, Rodrigo fez uma reportagem sobre o Banco Real (que, anos depois, foi comprado pelo Santander) e um fato lhe chamou a atenção… “Eu achei incrível que o banco tinha a visão de não apenas cuidar de negócios, mas se preocupar com o impacto também. Isso que a gente está falando de 2003, ou seja, uma época em que essa discussão era bem incipiente”, pontua.

A matéria, que foi publicada com o título “Respeito é bom e dá lucro”, agradou tanto a equipe do Banco Real que o jornalista foi convidado a se juntar ao time e unir sua voz para ampliar o alcance das ações voltadas à sustentabilidade que eles desenvolviam. “Na época, eu pensei: ‘Jornalista trabalhando em banco?! Eu vou trabalhar para o inimigo’”, conta, rindo. “Mas eu tinha conhecido algumas pessoas lá e acreditava muito no que eles estavam falando e fazendo, então resolvi aceitar”, acrescenta.

Desde então, Rodrigo iniciou uma trajetória profissional de preocupação com a sustentabilidade e o bem-estar social e desejo de conhecer e compartilhar histórias inspiradoras de empresas e pessoas que procuram fazer o bem. 

“Meu tempo foi ficando cada vez mais dedicado a isso. Acabei trabalhando oito anos no banco – de 2003 a 2011. Quando saí, fui fazer o que sempre quis, que era empreender. Assim, criei a ProfilePR, uma empresa de relações públicas. A gente tem sete anos de mercado e só trabalhamos com marcas e pessoas focadas em impacto, dentro desse contexto de Economia B também. Depois de um tempo, em 2016, comecei a pensar um pouco sobre a visão que a gente tem do estereótipo do ‘homem de negócios’”, reflete.

O perfil do homem de negócios

“Quando falamos em homem de negócios, normalmente visualizamos alguém de terno e gravata, possuidor de alguns bens que caracterizam o seu ‘sucesso’ – como o carro do ano e casas enormes. Ou seja, uma pessoa que passa a ser reconhecida pelo que tem. Essa é uma máquina que foi criada pela Revolução Industrial para sustentar esse consumismo desenfreado e maluco que existe no mundo, em que as pessoas precisam possuir alguma coisa para se sentirem bem e felizes”, analisa.

Na visão de Rodrigo, esse modelo que faz com que estejamos sempre correndo atrás do próximo “bônus” e de gerar lucro para os acionistas acabou “escravizando” muitas pessoas. Afinal, são muitos os que, por causa da rotina profissional incessante, acabam não vivendo da maneira que desejavam…  

“Em 2003, fui chamado pela Endeavor para escrever o livro Como fazer uma empresa dar certo em um país incerto?. Entrevistei 51 pessoas para escrevê-lo. Dentre elas, grandes empreendedores e executivos. No final de cada entrevista, eu sempre perguntava do que mais se orgulhavam e do que mais se arrependiam. Muitos se orgulhavam da empresa e da carreira que tinham construído. Contudo, não foram poucos os que relataram com uma voz grave que não tinham visto os filhos crescerem, que não tiveram tempo para a família. E isso me deixou perplexo. Esses empresários de sucesso estavam sofrendo! Eu sentia que era uma dor que de fato acometia aquelas pessoas”, relata.

Humanos de negócios

Impactado pelas histórias que conheceu nessa jornada, Rodrigo decidiu que não queria seguir esse rumo. “Eu não queria falar ‘olha como sou bem-sucedido. Olha minha casa, meu carro, meu bônus’, mas ter uma família disfuncional. Não queria que meu filho crescesse distante do pai”, declara.

Essa bagagem profissional e emocional culminou na ideia de criar um projeto voltado a contar as histórias de pessoas e empresas que acreditam no verdadeiro valor do trabalho; um trabalho voltado não apenas a gerar lucro para os acionistas, mas também contribuir com a sociedade e o mundo.

Foi durante um momento de relaxamento que nasceu o conceito de “Humanos de Negócios”. 

“Em 2016, certo dia eu estava tomando banho quando tive um daqueles insights. Eu pensei sobre por que temos essa visão do ‘homem de negócios’ e se precisava ser assim mesmo. Comecei a pensar em pessoas bem-sucedidas, mas que tinham construído uma carreira baseada em valores éticos, sustentáveis, passando por essa crença pessoal do que é justo, do que é bom para todo mundo e não fazer tudo para conseguir conquistar os objetivos do negócio, não importa o que tenha que fazer. Eu comecei a juntar esses nomes na minha cabeça e pensei: ‘essas pessoas têm uma visão humana muito forte’, uma visão de impacto muito relevante.

Ou seja, o que eu percebi foi que essas pessoas eram humanas e humanos de negócios.

Então me veio esse insight de querer conversar com essas pessoas, aprender com elas. Eu queria saber como elas construíram suas carreiras com bases nesses valores e ver o que poderia extrair desse material”, revela.

Quem são os humanos de negócios

Na prática, humanos de negócios:

  • Acreditam e praticam um novo jeito de ser e de fazer negócios e atuar na sociedade;
  • Constroem relacionamentos mais saudáveis, baseados em bom senso, respeito e reciprocidade;
  • Criam ambientes seguros emocional e psicologicamente, sem humilhar, punir ou castigar;
  • Cuidam de si mesmos, dos outros e do planeta. Investem no autoconhecimento para entender seu propósito e sua missão no mundo;
  • Resgatam valores essenciais a favor da vida em todas as decisões e assumem um compromisso ético com a regeneração das pessoas e do planeta;
  • Praticam a empatia e a compaixão por meio de posturas e atitudes que favorecem o encontro, no lugar da separação;
  • Investem na diversidade, trazendo para junto pessoas que pensam diferente, não somente aquelas que pensam como nós;
  • Buscam sempre compreender o próximo com um olhar altruísta;
  • Acreditam que gente vem primeiro e lucro vem depois porque não adianta ter resultados que agradam o mercado se as pessoas não estiverem bem;
  • Entendem que há a necessidade de resolver problemas do capitalismo e do mundo e assumem essa responsabilidade onde quer que estejam;
  • Apresentam coragem de fazer a mudança para espantar o medo que de maneira geral rege o mundo dos negócios e das relações;
  • São os novos arquétipos de sucesso e trabalham com base na confiança e no compromisso que cria vínculos de amor pela humanidade. Representam a esperança ativa de transformação.

O projeto e o livro Humanos de Negócios

Livro Humanos de negóciosDescobrir histórias de humanos de negócios se tornou uma grande missão para Rodrigo a partir de então.

De lá para cá, ele entrevistou dezenas de pessoas que se encaixam nesse perfil e passou a contar um pouco sobre elas em diversas plataformas – como no Instagram, no YouTube e em eventos organizados por ele e seu time.

Porém, o objetivo mesmo sempre foi lançar um livro. Tanto é que o processo de produção da obra começou ainda em 2016. Mas foi só em agosto deste ano, exatamente quatro anos depois de Rodrigo realizar a primeira entrevista para o projeto, que o livro Humanos de Negócios começou a se tornar realidade. 

É que foi no mês passado que aconteceu o lançamento da campanha de financiamento coletivo para a sua publicação. “A decisão de fazer o crowdfunding foi pensada para ajudar a espalhar para mais pessoas a ideia de reconhecer humanas e humanos de negócios que estão realizando e inspirando a transformação da sociedade”, explica.

Na obra, Rodrigo compartilha a história de 26 líderes inspiradores que estão transformando o capitalismo e a sociedade. O desejo do autor é que “essas histórias possam causar em você uma reflexão sobre como usa hoje sua energia, dinheiro e tempo neste lindo planeta”. 

Na galeria de imagens abaixo, você conhece quatro humanos de negócios que têm suas histórias contadas no livro. Para conhecer os demais, clique aqui.

Para que o livro Humanos de Negócios seja publicado ainda este ano, a meta da campanha de financiamento coletivo precisa ser batida até o dia 10 de outubro. A gente já contribuiu! Você pode saber mais – e fazer a sua contribuição – clicando aqui.
Ah, e uma curiosidade: Humano de Negócios será lançado pela Editora Voo, uma empresa B certificada que também publicou Pare de vender assim, que apresentamos aqui.

A colaboração de cada um

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Nós e Rodrigo Cunha compartilhamos a mesma opinião: preocupar-se com a sustentabilidade do planeta e com o bem-estar das sociedades deve ser uma premissa básica para qualquer empresa. Mas não só as empresas que precisam se preocupar com isso – e nem tampouco apenas o poder público. Cada um de nós deve, individualmente, contribuir para a construção de uma sociedade melhor.

Não sabe como fazer isso? A reflexão que encerra nossa conversa com o fundador do projeto Humanos de Negócios é um bom ponto de partida.

“Antes de mais nada, a gente precisa mudar as referências.

As referências que temos hoje são aquelas que eu falei, que eu brinco que são os James Bond do mundo corporativo. Ou seja, são pessoas que têm ‘licença para matar’, desde que entreguem resultados para os acionistas.

Existe um conceito que se chama sense making, que tem a ver com o sentido que a gente faz das informações que recebe. A primeira coisa que precisamos fazer para levar isso para o nosso dia a dia é exercitar o nosso senso crítico e entender as informações que nos falam. Todo esse movimento de fake news veio para provocar essa reflexão sobre senso crítico para a gente entender os padrões que seguimos há muito tempo, sem questionar de alguma maneira – como, por exemplo, olhar para uma pessoa e achar que ela é bem-sucedida pelas coisas que tem.

Se as pessoas exercitarem esse senso crítico – sempre que forem tomar uma decisão, comprar algo, entrar em um debate, investir energia alimentando uma visão, pensar no que querem construir etc. – e refletirem mais sobre o que estão fazendo, eu acredito que elas têm o potencial de transformar até mesmo a maneira como as empresas vão se comportar. Porque as empresas dependem do que as pessoas consomem. E o que as pessoas vão consumir, ao exercitar esse pensamento crítico? Aquilo que realmente é importante para elas”, conclui.

Acompanhe o projeto Humanos de Negócios!

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