“Muito discurso e pouca ação.” É assim que Onara Lima, executiva de sustentabilidade e ESG, avalia a maioria dos relatórios de sustentabilidade. Mas o que e como comunicar?
Nos últimos meses, meu e-mail ficou lotado de press releases que tinham quase o mesmo assunto: “Empresa X apresenta seu novo relatório de sustentabilidade”.
Depois de ler vários desses materiais, percebi que havia algo em comum entre muitos deles: design bonito, algumas histórias interessantes e… só. Eram poucos os que de fato comunicavam algo relevante em termos de métricas climáticas, ações para reduzir emissões de gases de efeito estufa, iniciativas que impactam positivamente a comunidade em que essas organizações estão inseridas, metas de equidade de gênero na liderança, etc.
E eu não estou sozinha nessa percepção.
A qualidade dos relatórios ESG/de sustentabilidade esteve em foco em diversos debates do ESG Summit Europe*, evento que aconteceu no início do mês, em Madrid.
Refletindo sobre o que viram e ouviram, ao fim do evento, a executiva de sustentabilidade e ESG Onara Lima e o jornalista João Guilherme Brotto tiveram uma conversa franca e sem meias palavras 😬 sobre o que comunicar (e como comunicar) em relatórios de sustentabilidade e ESG:
Esse papo abre bem todos os outros debates que propomos nesta Farol.
Boa leitura!
Natasha Schiebel
Cofundadora e Head de Conteúdo A Economia B
*PS: Quer saber mais sobre o que vimos no ESG Summit Europe? Assista à primeira parte da entrevista com Onara Lima (aqui). Ah, também fizemos uma cobertura resumida no LinkedIn. Leia este e este posts (e se ainda não segue a gente por lá, aproveita para fazer isso).
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[Podcast] Crise climática: Como a comunicação pode (e deve) atuar
No início desta semana, ouvi este episódio do podcast “Comunicação pública: Guia de sobrevivência” e achei excelente.
Apesar de o foco da conversa ser o papel da comunicação pública na emergência climática, as reflexões e dicas apresentadas pelas convidadas são úteis para qualquer pessoa/profissional que entende que essa é uma pauta coletiva.
Heloísa Fischer, especialista em Linguagem Simples, e Thaís Brianezi, pesquisadora em Comunicação Ambiental, falam sobre como comunicar os fatos com clareza e apresentam estratégias para engajar e mobilizar a população nessa causa.
[Cobertura internacional 🇬🇧] Ações seguem falando mais alto do que palavras
Faz pouco mais de um mês que estive em Oxford para cobrir o Louder Than Words (maior encontro de B Corps da história, organizado pelo B Lab UK), mas ainda não compartilhei com você tudo o que trouxe de lá.
Nesta Farol, trago uma reflexão sobre o que torna uma empresa um negócio bonito (beautiful business), uma história que exemplifica esse conceito e os destaques de um painel que reuniu três profissionais que se tornaram ativistas depois de atuarem em grandes corporações, no mercado financeiro e em órgãos governamentais.
Pensamentos que iluminam e ecoam
“O desejo é o motor mais poderoso do comportamento humano, mas o transformamos em algo negativo dentro da economia verde. Minha sugestão não é que o usemos para impulsionar mais consumo, mas que ele faça parte da alquimia de duas forças humanas muito simples que nos ajudam a ser e comprar melhor – a confiança e o desejo. É da junção desses dois ingredientes que nasce o que chamamos de ‘beautiful business’. (…)
É preciso fundir confiança e desejo no núcleo do seu negócio, da sua marca e dos seus comportamentos em uma visão e estratégia singular. É assim que a gente ajuda nossos clientes a fazerem a coisa certa sem sacrificar o bem-estar que sentem e fazendo o que desejam sem comprometer a própria consciência.”
Mary Portas
Autora de Rebuild: How to thrive in the new Kindness Economy e fundadora da consultoria Portas
Empresas que são forças para o bem
Todos os dias, 1 milhão de árvores são cortadas para fabricar papel higiênico tradicional. Além disso, globalmente, 2 bilhões de pessoas não têm acesso a um banheiro e aproximadamente 289 mil crianças menores de cinco anos morrem todos os anos de doenças causadas por água e saneamento inadequados.
A Who Gives a Crap é uma empresa com sede em Melbourne, Austrália, que nasceu com o objetivo de mudar esse cenário. E como ela faz isso? Produzindo papel higiênico ecológico a partir de fibras recicladas ou de bambu certificado pelo FSC e doando 50% dos seus lucros para organizações que ajudam a construir banheiros e melhorar o saneamento em países em desenvolvimento. Desde 2013, a Who Gives a Crap doou mais de 8 milhões de euros para seus parceiros.
Na visão de Mary Portas, esse é um ótimo exemplo de beautiful business. “Eles pegaram o produto mais básico e o tornaram desejável, o que é muito inteligente”, disse no palco do New Theatre.
Visite o site e saiba mais.
Qual é a mudança mais vital para reverter o rumo da crise climática?
Como contei na última Farol, um painel do Louder Than Words de que gostei bastante foi o “From Insiders to Activists – Navigating systems change for a better economy”, que reuniu três profissionais que fizeram carreira em grandes corporações, no mercado financeiro e em órgãos governamentais, e acabaram se tornando ativistas climáticos. São eles:
- Anuradha Chugh (conselheira do B Lab UK)
- Chris Skidmore (ex-Ministro de Energia do Reino Unido)
- Amy Clarke (cofundadora da Tribe Impact Capital)
A conversa foi interessante do ponto de vista pessoal (os três têm ótimas histórias de transição de carreira) e também trouxe reflexões sobre o ativismo dentro e fora das organizações.
No encerramento do painel, o moderador Chris Turner (Diretor Executivo do B Lab UK) perguntou aos três: “Qual é a mudança mais vital para reverter o rumo da crise climática?”.
💡 Chris Skidmore destacou a necessidade de padronizar regulamentações e políticas globais para acelerar a transição climática e reduzir custos.
“Net Zero não é apenas um imperativo climático, é uma oportunidade econômica para redefinir como vendemos produtos e fazemos negócios. Este é o momento decisivo, e se quisermos ter impacto, precisamos apoiar as empresas em suas jornadas para essa transição.”
💡 Amy defendeu um tratado de não proliferação de combustíveis fósseis e a necessidade de trazer indústrias poluentes de volta à propriedade pública para estimular a transição energética.
Além disso, ela falou sobre a importância de trazermos outras pessoas para o debate.
“Para isso, precisamos fazer com que elas se sintam seguras, cuidadas e apoiadas. E uma coisa que o movimento B Corp não pode se tornar é tão insular a ponto de não permitir a entrada de outros. Precisamos criar santuários para nós mesmos, mas precisamos estar dispostos a abrir esses santuários para que outras pessoas possam vir, se sentir acolhidas, apoiadas e felizes ao se reconectar com seus próprios valores, e então impulsionar a mudança de que precisamos em suas indústrias.”
💡 Por fim, Anuradha sugeriu uma abordagem mais prática e colaborativa, com coalizões dentro das indústrias para influenciar mudanças significativas de maneira mais imediata.
“Sinto que, sozinhos, estamos apenas ‘limpando a praia’, e isso não vai mudar o sistema. Precisamos colaborar com outras organizações e especialistas que entendem a mudança sistêmica melhor do que as empresas individualmente”, concluiu.
Como lembrou Amy, “nenhum de nós está fora do sistema, todos estamos dentro dele, existem apenas graus de separação nesse sistema”. Partindo do seu lugar, o que você pode fazer para avançar em alguma dessas áreas?
Encontramos o caminho para destravar o ESG na sua organização
Você sabia que A Economia B tem um serviço que transforma curadoria de conteúdo e coberturas de eventos e festivais na Europa em ações de letramento e treinamento para ajudar sua organização a navegar pelas complexidades dessa era de policrise e urgências climáticas?
Quer saber como funciona? Acesse esta página.
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[Livro] Gente ultraprocessada: por que comemos coisas que não são comida, e por que não conseguimos parar de comê-las
Na última Farol, recomendei o primeiro episódio da nova temporada do podcast Prato Cheio, em que os repórteres de O Joio e o Trigo investigam as origens do bilionário mercado de águas engarrafadas.
Aí ouvi o segundo e o terceiro e quase incluí os dois aqui (#ficadica). Pra não ser repetitiva (mas você já entendeu que a dica tá dada, né?), decidi indicar o livro que conheci por causa do podcast, estou lendo e gostando muito.
Como comenta a socióloga Paula Johns na apresentação do livro, “Gente ultraprocessada coloca em xeque a crença de que temos um grande poder de escolha em relação ao que comemos”.
Na obra, o infectologista Chris van Tulleken revela o que descobriu ao passar algumas semanas se alimentando basicamente de alimentos ultraprocessados (conceito que, aliás, nasceu no Brasil – você sabia?).
Você sabia que…
O uso de IA neste setor tem potencializado ainda mais esses benefícios para os agricultores. Um exemplo disso é a iniciativa AI for Agriculture Innovation, um projeto do Fórum Econômico Mundial, em parceria com o governo de Telangana, na Índia, que ajudou os produtores de pimenta a aumentar em 21% a produtividade, reduzir em 9% o uso de pesticidas e obter um acréscimo de US$ 800 na renda por acre a cada ciclo.
No último artigo da nossa série sobre a revolução do setor de alimentos e bebidas, revelamos como a agricultura regenerativa, aliada à inteligência artificial, pode ajudar a aumentar a produtividade agrícola, regenerar ecossistemas e combater as mudanças climáticas.
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[Vídeo] Emissões de escopo 1, 2 e 3 descomplicadas
Já que comunicação foi um tema importante desta edição da Farol, aproveito para recomendar um vídeo que apresenta uma explicação superdidática sobre o que são emissões de gases de efeito estufa dos escopos 1, 2 e 3. Essa é uma ótima ferramenta para quem precisa explicar o conceito para pessoas não tão letradas no tema.
Apesar de o vídeo estar em inglês, é possível ativar legendas automáticas em português.
Para seguir pensando
🇧🇷
- [via UOL] Átila faz publicidade com petrolífera; é a agenda anti-COP 30 no ar
- [via Newsletter Carlos Nobre] A emergência climática é uma crise dos direitos das crianças
- [via Nonada] “Os adultos precisam melhorar”: o que crianças Kaingang pensam sobre o futuro do planeta
- [via ClimaInfo] Negociações preparatórias avançam pouco e definições sobre financiamento climático ficam para a COP29
- [via Um Só Planeta] Universidade de San Diego, nos EUA, passa a exigir aulas sobre mudanças climáticas para alunos se formarem
🏴🇺🇸
- [via The New York Times] How to Be Truly Free: Lessons From a Philosopher President – “Que animal complicado é o ser humano. É um bicho inteligente e estúpido ao mesmo tempo”. Essa é a última frase dessa bela entrevista feita pelo jornalista Jack Nicas com Pepe Mujica, ex-presidente do Uruguai. Mujica fala sobre vida, morte, esperança (e desesperança), livros, crenças… como diz o título, é uma entrevista cheia de lições de um filósofo presidente.
- [via The Guardian] Trees and land absorbed almost no CO2 last year. Is nature’s carbon sink failing? – O “sistema imunológico” terrestre parece estar falhando. Essa reportagem do jornal britânico The Guardian conta que o aumento da temperatura média global tem prejudicado a capacidade de absorção de carbono pela natureza e, claro, debate as consequências disso.
- [via LinkedIn e Forbes] No fim de agosto, Jonathan Porritt, que foi conselheiro da Unilever por 28 anos, publicou no LinkedIn o artigo “Unilever: Profits Up; Purpose Down”, em que diz, por exemplo, que “o enfraquecimento das metas [de sustentabilidade], a redução das ambições, a incoerência interna e externa, e a ‘priorização’ dos interesses dos acionistas são indiscutíveis”. Robert G. Eccles decidiu apresentar sua visão sobre a postura da empresa neste artigo publicado na Forbes. É uma “batalha” interessante de visões.
- [via euronews] How do solar railways work? Startup gets green light for pilot project in Switzerland – Eu achei essa história muito doida: tem uma startup suíça testando a instalação de painéis solares em trilhos de trem! 😮 A matéria fala sobre os desafios – como o fato de que o sol refletido nos painéis poderia atrapalhar a visão dos maquinistas –, mas também mostra como soluções podem surgir nos lugares mais inesperados.
Spoiler da próxima edição da Farol
Recentemente, aconteceu aqui em Valência o The Gap in Between, evento organizado pela Social Nest Foundation com o objetivo de debater alguns dos principais desafios sociais e ambientais que enfrentamos e apresentar startups que estão desenvolvendo soluções para eles.
Dê o play no vídeo abaixo para assistir a um breve resumo do que vi por lá. Trago detalhes dessa cobertura na próxima Farol.
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