Combater o preconceito racial é uma missão de todos! Conheça 4 organizações que adotaram posicionamentos e iniciativas antirracistas e inspire-se nelas para pensar em ações para colocar em prática no seu dia a dia
– Uma mulher é morta após levar oito tiros dados por policiais que invadiram sua casa. Os responsáveis continuam livres.
– Um homem é asfixiado por um policial que pressionava o joelho contra seu pescoço enquanto três outros agentes assistiam inertes ao homem suplicar “Eu não consigo respirar”.
– Um adolescente de 14 anos é baleado enquanto tentava ir à escola, mas teve seu trajeto interrompido por tiroteios.
As histórias de Breonna Taylor, George Floyd e Marcos Vinícius da Silva estiveram em destaque nos noticiários e nas mídias sociais nas últimas semanas. Foram elas, aliás, que impulsionaram milhares de manifestações antirracistas em todo o mundo.
Mas, infelizmente, esses não são casos casos isolados. Pelo contrário. A violência e o descaso contra pessoas negras faz parte da cultura e das relações sociais ao redor do globo – inclusive no Brasil, onde os cidadãos negros e pardos compõem mais da metade da população (56,3%).
A desigualdade racial no país pode ser percebida em diferentes esferas e contextos:
Segundo o estudo A distância que nos une – Um retrato das Desigualdades Brasileiras, desenvolvido pela ONG Oxfam, os brasileiros brancos ganham, em média, o dobro do que os negros. A previsão da entidade é que, no ritmo atual de diminuição dessa desigualdade, a equiparação salarial entre negros e brancos deve ser alcançadas apenas em 2089. Ou seja, dois séculos após a escravidão ter sido oficialmente abolida no Brasil.
De acordo com o Atlas da Violência 2019, a taxa de homicídios de mulheres não negras cresceu 4,5% entre 2007 e 2017. Contudo, nesse mesmo período, o número de assassinatos de mulheres negras aumentou 29,9%. Entre todos os feminicídios ocorridos em 2017, 66% foram de mulheres negras.
De maneira geral, a população negra é a mais afetada pela violência no Brasil. O Atlas da Violência 2019 aponta que, no período de uma década (2007 a 2017) a taxa de homicídio de pessoas negras cresceu 33,1%, enquanto o índice de assassinatos de não negros subiu 3,3%. Ou seja, o número de mortes violentas de negros foi 10 vezes maior. Em 2017, 75,5% das vítimas de homicídios foram indivíduos negros.
O cenário é o de uma guerra: um levantamento nacional indica que a cada 23 minutos um jovem negro é assassinado no Brasil.
Uma pesquisa da Universidade de Brasília (UNB) revelou que entre 2004 e 2014, apenas 2,5% dos autores publicados no Brasil não eram brancos. E ainda, apenas 6,9% dos personagens retratados nos romances eram negros, sendo que, destes, só 4,5% eram protagonistas da história.
O levantamento identificou também que personagens negros geralmente são retratados como bandidos, empregados domésticos, escravos, profissionais do sexo e donas de casa.
Tudo isso aponta para uma realidade dura para quem nasce negro ou pardo: o racismo é algo “normalizado” e que faz parte das relações sociais e do sistema que beneficia os brancos e negligencia a população afrodescendente. É o que especialistas chamam de racismo estrutural.
“Quando a gente fala de racismo estrutural, o adjetivo estrutural indica que o racismo não é apenas o resultado de atos voluntários, que se limitam ao plano individual. O racismo está para além disso. Ele é, na verdade, um processo no qual, até mesmo de maneira inconsciente, as pessoas reproduzem as condições em que a desigualdade racial é possível”, explicou Silvio Almeida, jurista, professor e autor do livro O que é racismo estrutural, em entrevista ao NEXO.
Djamila Ribeiro, filósofa, ativista brasileira e autora do Pequeno manual antirracista, complementa dizendo que o racismo faz parte da estrutura da sociedade brasileira, assim como o capitalismo e o sexismo. “No Brasil, é comum as pessoas associarem racismo a um ataque sofrido por uma pessoa negra famosa, por exemplo, mas não se entende que racismo é também uma empresa ter 90% dos funcionários brancos, chegar nos espaços e não ter pessoas negras o suficiente, só em lugares de subalternidade”, destacou, em entrevista à Carta Capital.
Então, se o racismo faz parte do sistema social, o poder privado, parte integrante dessa sociedade, tem responsabilidade e participação ativa na reprodução da discriminação a pessoas negras. Afinal, as empresas são instituições formadas por indivíduos – que perpetuam o racismo estrutural (conscientemente ou não).
Almeida acrescentou ainda que “falar que o racismo é estrutural não significa, de maneira nenhuma, retirar a responsabilidade individual que as pessoas têm em uma sociedade racista”.
Ele defende que a única forma de não ser racista e de realmente não compactuar com o racismo é adotando uma postura antirracista, lutando contra discursos e atitudes preconceituosas. “Não existe possibilidade de combater o racismo a não ser dentro de uma postura ativa contra ele, o que significa se voltar inclusive contra si mesmo, em um processo de autoavaliação permanente, de olhar para si mesmo e verificar o quanto seus atos enquanto indivíduo estão compactuando para a reprodução das condições em que o racismo se manifesta”, reflete.
Por conta das manifestações nas redes sociais e nas ruas, especialmente em torno do movimento #BlackLivesMatter (#VidasNegrasImportam), marcas têm se posicionado como aliadas na luta antirracista. Contudo, ao mesmo tempo, muitos consumidores e até mesmo colaboradores têm criticado e denunciado empresas cujo apoio à causa fica relegado a discursos de marketing… Ou seja, que, na prática, não agem efetivamente para combater o racismo estrutural em suas operações e em seus processos seletivos.
Nesse sentido, uma das principais barreiras para que mudanças dentro das empresas realmente aconteçam é o fato de que, de maneira geral, os negros ainda possuem baixa representatividade nas organizações. Isso acontece especialmente nas posições mais elevadas – que, inclusive, possuem autonomia e poder para efetivamente impulsionar iniciativas antirracistas.
Para mudar esse cenário e fazer com que as empresas contribuam de fato com a luta antirracista, é preciso haver dedicação dos indivíduos dentro das organizações. Tudo começa, como indicou Almeida, com um processo de autoavaliação.
Estas são algumas atitudes que podem ajudar nesse sentido:
Comentário importante:
Entendemos que não existe empresa perfeita. Ao apresentar os exemplos abaixo, nosso objetivo não é endossar as marcas, mas compartilhar especificamente as iniciativas antirracistas colocadas em prática por elas. Além disso, queremos que essas histórias o inspirem a se engajar na luta antirracista – tanto pessoalmente, como na empresa em que você trabalha.
A marca de sorvete, que possui a certificação B-corp, há tempos se posiciona ativamente em problemas sociais e políticos. Entre as causas em que a empresa atua destacam-se, por exemplo: mudanças climáticas, igualdade LGBTQIA+, democracia, fair trade e justiça racial.
Inclusive, após o assassinato de George Floyd, a companhia publicou uma declaração defendendo o fim da supremacia branca. No documento, a empresa demanda uma série de ações do governo para acabar com a injustiça contra negros – ações que vão desde mudanças na legislação até a criação de uma força tarefa para monitorar a violência policial contra a comunidade negra.
Além disso, a marca atua em parceria com diversas organizações antirracistas – como, por exemplo, a Colors of Change, que trabalha com tomadores de decisão nas empresas e no governo para criar um mundo mais humano e menos hostil para os negros. Aliás, a Ben and Jerry’s até criou um sabor de sorvete especial – chamado Pecan Resist – cujo lucro será destinado para apoiar essa e outras instituições de apoio à resistência negra.
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A fintech brasileira também se posicionou por meio de um comunicado via redes sociais. Nele, a marca falou inclusive sobre sua própria responsabilidade. A empresa declarou que precisa caminhar muito para que seu quadro de funcionários reflita a realidade brasileira e para exercer o antirracismo de maneira efetiva. Além disso, confessou que ainda está aprendendo a executar isso de forma consistente.
O texto foi assinado pelos Nu-blacks, profissionais da Nubank que se autodeclaram pretos e pardos e têm a missão de aumentar a conscientização sobre equidade racial na organização.
Em entrevista à Exame, Cristina Junqueira, cofundadora da fintech, admitiu que a empresa está longe do que considera o número ideal em termos de representatividade negra. “Nós queremos ser protagonistas em relação ao papel que temos. Queremos ouvir o que a comunidade negra tem para dizer dentro de casa, a gente sabe que nunca vai entender exatamente como essas pessoas vivem, e a dor delas, ou o que elas passam, mas temos consciência de que não podemos nos conformar com as questões estruturais e que precisamos contribuir para a solução”, declarou a executiva.
A RD Station, empresa de tecnologia para a área de Marketing, tem diversos programas voltados a estabelecer a diversidade dentro da organização. Entre eles está movimento Preto no Preto. O grupo nasceu como uma forma de debater questões raciais e promover a diversidade de raças dentro do time.
Além disso, todos os anos a empresa promove a Semana da Consciência Racial. Nela, os colaboradores são chamados para refletir e discutir a desigualdade social. E ainda, o movimento também tem promovido o Black Talks, evento em que profissionais negros debatem a representação da comunidade negra no setor de tecnologia.
Por fim, no ano passado, a RD lançou um Plano de Igualdade Racial para estabelecer diretrizes na busca de diversidade racial.
Reconhecer que o racismo é estrutural e que cada empresa tem responsabilidade direta sobre a reprodução de discursos e atitudes que prejudicam a comunidade negra é o primeiro passo para o desenvolvimento de um mundo corporativo mais igualitário e justo.
Foi justamente a partir dessa premissa que a Fractured Atlas, empresa de tecnologia voltada ao mercado artístico, decidiu fazer da luta antirracista uma de suas missões.
Para começar, há cinco anos, a companhia mudou sua declaração de valores, comprometendo-se a ser antirracista e antiopressiva em tudo o que faz.
A organização então passou pela avaliação de funcionários e consultores externos, examinando todos os aspectos da experiência de trabalho – desde a forma como as descrições de cargos são escritas, até os candidatos que contratam e a política de viagens e despesas.
Além disso, uma análise foi feita para:
Como resultado, o cenário atual na Fractured Atlas é o seguinte:
Chamada para transparênciaNo perfil da campanha no Instagram, há informações sobre diversas marcas que já revelaram o percentual de profissionais negros em cargos de liderança. |
Indo além de iniciativas antirracistas no mundo corporativo, existem negócios que nascem com o objetivo de melhorar a qualidade de vida da população negra.
Caso, por exemplo, das seis empresas que apresentamos neste artigo. Não deixe de ler.
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Excelente matéria.