Confira os destaques da COP27, conheça os acordos que beneficiam o Brasil e saiba qual é a visão de ativistas em relação ao que foi definido no principal encontro sobre mudanças climáticas do planeta
Entre os dias 6 e 18 de novembro de 2022, aconteceu em Sharm el-Sheik, no Egito, o principal evento sobre o clima do planeta: a COP27 (27ª Conferência das Partes). O encontro reuniu aproximadamente 35 mil pessoas da sociedade civil, representantes dos governos, especialistas, ativistas e comunicadores.
Neste ano, o evento prometia sair das negociações e “planejar a implementação” de todos os compromissos firmados anteriormente. Porém, apesar de alguns avanços, pouco efetivamente foi decidido em relação às ações de mitigação necessárias para evitar o desastre climático iminente…
Um misto de esperança e frustração. É possível resumir assim o sentimento geral em relação ao que aconteceu na COP27.
Um dos principais destaques do encontro foi a criação de um fundo que será financiado pelos países desenvolvidos (e os maiores emissores de gases de efeito estufa) para reparar perdas e danos sofridos pelas regiões mais vulneráveis e mais impactadas pelas mudanças climáticas.
Porém, muitos especialistas e ativistas veem essa decisão como apenas mais “blablabla”. O sentimento de desilusão é justificado, afinal, inúmeras promessas feitas em COP anteriores continuam no mundo das ideias.
Indo além, apesar de muito discurso, falta uma linguagem direta sobre o que será feito para tirar os compromissos do papel e eliminar o uso de combustíveis fósseis, por exemplo.
Mas antes de nos aprofundarmos no acordo apresentado ao final da COP27, precisamos dar um passo atrás e falar sobre o contexto das mudanças climáticas…
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Você já ouviu falar em orçamento de carbono?
Essa é a conta que determina o limite de emissões de dióxido de carbono (CO2) que nosso planeta pode suportar sem que as temperaturas globais aumentem além de 1.5 °C em relação ao período pré-industrial. O aquecimento além desse limite causará danos devastadores aos ecossistemas globais, com efeitos desastrosos para a humanidade.
O problema é que, graças aos nossos “gastos” exorbitantes de carbono, estamos bem próximos de ficar no vermelho.
Desde 1985, as atividades humanas já liberaram mais de 2.500 bilhões de toneladas de CO2 (GtCO2) na atmosfera. E mais, a velocidade e a intensidade com a qual poluímos o planeta só tem aumentado: nos últimos 30 anos, adicionamos tanto CO2 à atmosfera quanto nos trinta mil anos anteriores.
Sendo assim, restam menos de 500 GtCO2 do orçamento de carbono para que o aquecimento do planeta fique abaixo de 1,5°C.
No entanto, dizer que ‘a humanidade’ é responsável por essas emissões pode passar uma ideia equivocada de que todos emitem igualmente e que, portanto, ‘estamos todos no mesmo barco’.
Por um lado, uma pequena parcela (mais rica) da população mundial é responsável pela maioria das emissões de CO2 globais. Por outro, são as regiões mais vulneráveis econômica e socialmente que mais sofrem as consequências das mudanças climáticas.
Aliás, o desequilíbrio das mudanças climáticas está presente tanto em suas causas, como em suas consequências.
O levantamento indica, por exemplo, que Moçambique, Zimbábue e Bahamas foram os países mais afetados pelos impactos dos eventos climáticos extremos em 2019. Mas naquele ano, enquanto a China, sozinha, emitiu 12 mil toneladas CO2, esses três países juntos emitiram cerca de 227 toneladas de CO2.
A tragédia enfrentada pelo Paquistão este ano é outro exemplo claro de como as mudanças climáticas afetam de maneira desproporcional países em desenvolvimento…
Durante o verão de 2022, o Paquistão foi atingido por enchentes recordes que deslocaram 33 milhões de pessoas e mataram cerca de 1.500. De junho a agosto, o país recebeu quase três vezes a precipitação média de 30 anos.
Estudos indicam que essas inundações na região podem ser atribuídas às mudanças climáticas, que provocaram monções recordes e derretimento de geleiras após uma onda de calor em maio (quando o país registrou uma das temperaturas mais altas do mundo: 53,7 °C).
Ou seja, há um desequilíbrio entre quem mais contribui para as mudanças climáticas e quem paga por isso em custos humanos, sociais e econômicos.
É por isso que a chamada responsabilidade histórica está no centro dos debates sobre justiça climática. Na prática, significa que os maiores responsáveis pelas mudanças climáticas têm a obrigação de ajudar as regiões mais afetadas por essa crise. Inclusive, esse foi um dos principais temas em negociação na COP27…
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Depois de muitos debates, os líderes mundiais que participaram da COP27 chegaram a um acordo sobre a criação de um mecanismo de financiamento para compensar as nações vulneráveis por perdas e danos causados por eventos climáticos extremos.
Essa é uma decisão histórica. Afinal, pela primeira vez em 30 anos de negociações climáticas, os países desenvolvidos concordaram em fornecer financiamento para ajudar a resgatar e reconstruir os países mais pobres atingidos por desastres relacionados ao clima.
Por falar em promessas não cumpridas, durante a COP27, António Guterres, secretário-geral da ONU, enfatizou a necessidade de cumprir um compromisso antigo, que vem sendo adiado: destinar US$ 100 bilhões por ano em financiamento climático para países em desenvolvimento, estabelecendo clareza e um roteiro confiável para dobrar os fundos para adaptação.
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É importante lembrar que a principal agenda da COP e a razão de esse evento existir é a criação de esforços para a redução de emissões de gases de efeito estufa, com foco em limitar o aquecimento global em até 1.5 °C.
Neste sentido, apesar de a criação do fundo de perdas e danos ser um passo importante no caminho da justiça climática, a verdade é que houve pouco avanço em outras questões importantes relacionadas às causas das mudanças climáticas, particularmente sobre a eliminação gradual de combustíveis fósseis e uma linguagem mais rígida sobre a necessidade de limitar o aquecimento global a 1,5 °C.
Nesse sentido, como aponta Guterres, é preciso acabar com o “vício em combustíveis fósseis”, e investir massivamente em energias renováveis é fundamental para isso.
A ativista de justiça climática Mitzi Jonelle Tan reforça que, no momento, o fundo de perdas e danos é apenas um balde vazio – e que estamos cheios de baldes vazios vindos de outros acordos anteriores!
Além disso, ela destaca a importância de o financiamento desse fundo não colocar os países já abalados pela crise climática em débito.
Mitzi ressalta ainda que a fonte desse financiamento e as condições de sua distribuição também devem ser analisadas. “O fundo tem que ser novo, não reatribuído. Além disso, tem que ser imediato e não pode vir com políticas neoliberais que dificultem a vida dos mais marginalizados. Ou seja, ainda há muito a ser falado sobre como deve ser fornecido o financiamento. De quem e de onde deve vir? Então, ainda há conversas importantes, e temos que lutar por isso”, frisa.
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O Brasil esteve em destaque na COP27 com a presença do presidente-eleito Luiz Inácio Lula da Silva e de parte de sua equipe de transição.
Em um comunicado feito durante o evento, Lula anunciou que “o Brasil está de volta”, indicando que, em sua gestão, o país estará mais aberto aos debates climáticos.
Lula sinalizou também que “volta para cobrar o que foi prometido e não foi cumprido”, fazendo referência aos 100 bilhões de dólares anuais que viriam dos países mais ricos para ajudar os mais pobres a enfrentarem a crise climática. Esse fundo, que havia sido acordado na COP15 (2009) – quando Lula estava em seu segundo mandato –, deveria ter saído do papel há dois anos.
Outro resultado da participação de Lula na COP27 foi o acordo fechado com o governo da Noruega para a reestruturação imediata do Fundo Amazônia.
Este fundo é um mecanismo global para captação de doações para investimentos não reembolsáveis em ações de prevenção, monitoramento e combate ao desmatamento, e de promoção da conservação e do uso sustentável da Amazônia Legal.
De acordo com Espen Barth Eide, ministro do Clima e Meio Ambiente da Noruega, a ideia é criar equipes técnicas para fazer com que a governança do fundo seja restabelecida e anunciada já nos primeiros dias do novo governo Lula.
Outra boa notícia que a COP27 trouxe para o Brasil foi a criação do Fundo Multidoadores das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável na Amazônia Legal (MPTF da Amazônia).
Esse é um mecanismo de financiamento lançado pela ONU Brasil e pelo Consórcio Interestadual Amazônia Legal, previsto para iniciar em 2023.
O MPTF da Amazônia visa beneficiar os grupos populacionais mais vulneráveis da região com ações que promovam:
Nesse sentido, Eduardo Tavares, secretário de Planejamento do Amapá, afirmou que o novo Fundo representa uma “ação concreta” para o desenvolvimento sustentável e para melhorar a qualidade de vida de uma parcela da população que convive com um grande paradoxo.
Estimativas indicam que o MPTF da Amazônia deve receber aporte de recursos na ordem de US$300 milhões para investimentos em propostas de desenvolvimento regional sustentável.
Segundo Eduardo, o fundo vai priorizar propostas para melhorar a governança ambiental e reduzir atividades ilegais, empoderar a população da região e apoiar assentamentos humanos e cidades sustentáveis, além de aprimorar o manejo de temas socioambientais.
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