No 6° episódio do programa A Economia B entrevista, Pedro Paro, CEO da Humanizadas e criador do primeiro rating ESG do Brasil, fala sobre orientação a stakeholders, capitalismo consciente e liderança humanizada
Em 2004, a Índia era o segundo maior país do mundo em número de habitantes e já figurava entre as 15 maiores economias globais. Ainda assim, seu PIB (de 709 bilhões de dólares) foi menor do que o investimento feito em marketing pelas companhias listadas no S&P 500, índice que reúne as 500 maiores empresas de capital aberto dos Estados Unidos.
Intrigado por esses dados, o consultor indiano Raj Sisodia conduziu uma pesquisa para investigar e mensurar o impacto de investimentos tão desproporcionais. Nesse processo, ele encontrou um grupo de empresas que investiam menos que a média, mas eram mais admiradas e tinham retorno financeiro superior às listadas no S&P 500.
Dessa investigação nasceu o livro Firms of Endearment, que Sisodia escreveu em parceria com David B. Wolfe e Jag Sheth. Anos mais tarde, a obra, lançada no Brasil como Empresas Humanizadas (Alta Books), ajudou a formar as bases do Capitalismo Consciente, movimento que surgiu nos Estados Unidos, em 2010, para disseminar os pilares que resultaram das investigações de Raj Sisodia:
- Liderança consciente
- Propósito elevado
- Orientação aos stakeholders
- Cultura consciente
Nós já falamos sobre o Capitalismo Consciente nessa entrevista com Dario Neto, então Diretor Geral do braço brasileiro do CC, e nessa conversa com Graziela Merlina, cofundadora e membro do Conselho Deliberativo. Recomendo a leitura das duas entrevistas para entender melhor as premissas do movimento que questiona o status quo do capitalismo.
Da pesquisa acadêmica ao empreendedorismo: como nasceu o primeiro rating ESG brasileiro
Em 2016, inspirado pelos estudos de Sisodia e incomodado com a visão negativa que o empreendedorismo passou a ter durante as investigações da Operação Lava Jato, Pedro Ernesto Paro, que estava concluindo um mestrado em cultura organizacional na Universidade de São Paulo (USP), decidiu se dedicar a descobrir se existiam empresas mais éticas e humanas no Brasil.
Para isso, focou sua pesquisa nos aspectos culturais das organizações. Ou seja, o objetivo era avaliar as empresas “não apenas do ponto de vista interno, mas das relações que nutrem com seus stakeholders”, conta.
Em 2018, já com as hipóteses de conexão entre cultura, consciência e resultados financeiros comprovadas, Pedro iniciou um doutorado para direcionar sua pesquisa ao capitalismo de stakeholders. Foi quando comandou um grupo de pesquisa na USP para replicar o estudo de Raj no Brasil. Assim nasceu a primeira edição do relatório anual Melhores para o Brasil, feito com base na análise de 79 empresas.
Porém, essa jornada que daria vida ao primeiro rating ESG brasileiro quase foi interrompida em 2019, quando o governo de Jair Bolsonaro cortou bolsas de pesquisa no país. Sem recursos para seguir, a existência do grupo estava em risco.
No entanto, muitas empresas se mostraram interessadas em fazer a avaliação de stakeholders. A virada de chave veio quando Pedro entendeu que o que tinha em mãos não era mais um grupo de pesquisa, mas um modelo de negócio.
Assim, em 2020, nasceu a Humanizadas, uma startup de inteligência de dados. Desde então, a empresa recebeu duas rodadas de investimento, realizou outras três pesquisas – chegando ao total de 805 empresas avaliadas – e, sobretudo, passou a questionar a credibilidade dos principais ratings ESG do mundo…
O ponto cego dos ratings ESG que direcionam os fluxos de investimentos
Em 2022, um banco espanhol procurou a Humanizadas para avaliar um grupo de 72 empresas. Foi a primeira vez que a Humanizadas analisou um portfólio global. Para isso, comparou a própria avaliação com as análises de algumas das principais agências de rating ESG do mercado (Refinitiv, Sustainalytics, MSCI e ISS), e encontrou um ponto cego.
Por avaliarem a agenda ESG com um viés financeiro e de risco, as agências não consideram aspectos comportamentais – como propósito, cultura e liderança –, justamente o elo central dos estudos de Raj Sisodia.
“Os grandes ratings ESG que o mercado financeiro se baseia têm zero correlação entre áreas como emissão de gases de efeito estufa e mulheres na liderança, por exemplo. Não estamos falando apenas de greenwashing nas empresas. A gente tem sérios problemas nas metodologias ESG”, revela.
Na visão de Pedro, se uma empresa tem práticas ESG, mas não tem liderança consciente, não consegue sustentar a estratégia a longo prazo. Assim, corre risco de cometer greenwashing, peoplewashing, diversitywashing e diversos outros. “Agora, se tem uma cultura e liderança saudável e boas práticas ESG, as coisas fluem mais naturalmente”, resume.
ESG e cultura organizacional: uma relação indissociável
Um bom exemplo prático disso foi quando, durante a entrevista que você vai assistir a seguir, falávamos sobre o escândalo de fraude das Lojas Americanas.
Pedro lembra que “além de uma série de processos de governança e questões contábeis que não foram auditadas corretamente, há também um histórico de anos de conversas difíceis que não foram feitas, de apontamentos e críticas que não aconteceram e que revelam comportamentos e questões culturais. São anos de pessoas que viram coisas, mas não falaram por medo de falar”.
Como Peter Drucker eternizou, “a cultura come a estratégia no café da manhã”.
Para entender a história da Humanizadas em detalhes e aprofundar tópicos sobre ratings ESG, liderança humanizada e orientação a stakeholders na prática, conversei com Pedro durante quase uma hora.
O resultado do papo está no novo episódio do programa A Economia B Entrevista. Entre os temas abordados, estão:
- O que é e de onde vem o capitalismo de stakeholders?
- A história da Humanizadas e do primeiro rating ESG brasileiro
- Por que os principais ratings ESG do mundo são falhos?
- Os diferentes níveis de consciência da liderança
- 3 passos para se tornar uma empresa humanizada
- Uma agenda estratégica para a gestão de pessoas
- As múltiplas crises dos últimos anos e a crise de significado
- O que nos trouxe até aqui não vai nos levar adiante
- O Grupo Jacto, a cidade de Pompeia e o Brasil que tem jeito
- Um olhar mais inteligente sobre como pensamos negócios e gestão
- Livros e documentários para aprofundar os estudos
Assista:
Leia o artigo Iluminando o ponto cego da agenda ESG, publicado na revista MIT Sloan Management Review Brasil e citado por Pedro Paro na entrevista
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